A conversa
com “um novo amigo de antigas batalhas”* aconteceu a bordo de dois cafezinhos,na
praça da igreja, o meu puro sem açúcar.
O papo nos remetia ao primeiro turno
das eleições para presidente e concordávamos sobre a força das
religiões – no caso católicos e neopentecostais do mesmo lado conservador,
alguns à direita da direita, com a Opus Dei apoiando Serra.
Segundo meu amigo, a força das religiões vem
do fato de que sua ideologia toca o coração das pessoas.
Não vou tão
longe, mas sou lembrado da guerra interminável na Palestina e me recordo, também,
de matanças até entre populações hindus. As convicções justificam tudo. Cristãos
e muçulmanos vêm há milhares de anos lutando pela posse de Jerusalém, mas o
poder, no século 21, está mesmo com uma terceira força: os judeus.
O futuro,
quando os poços de petróleo do Oriente Médio não produzirem mais, pode
determinar uma reviravolta. Não haverá mais porque manter o papel de Israel
como guardião dos combustíveis que movimentam o Ocidente.
Uma rápida
viagem de volta ao Brasil nos leva ao fato de que não foram as religiões que
determinaram a ida de Dilma Rousseff para o segundo turno, mas o uso que delas
fizeram a direita conservadora.
Muitos dos padres e pastores que incitaram suas
ovelhas a descarregar votos em Marina
Silva foram, simplesmente, enganados pela mídia. Muita gente boa acreditou que o programa de governo do PT
incluía o incentivo ao aborto. Ou coisa parecida.
Chegamos,
então, ao paradoxo de ambos os candidatos, por força das circunstâncias, apoiarem o que há de mais retrógrado: a criminalização do aborto e, por consequência
imediata, a impossibilidade de mulheres vítimas de intervenções mal feitas
terem acesso ao socorro médico do SUS.
É
complicado, mas pessoas religiosas, próximas das vítimas, sempre poderão dizer que a morte
foi um desígnio de Deus.
E o que virá
a seguir? Munidos do poder que estão adquirindo na eleição, as igrejas devem
arrancar do vencedor - provavelmente Dilma Rousseff - prerrogativas que ampliem
ainda mais sua atuação, que já se faz, principalmente, entre as populações de
baixa renda, com menor grau de escolaridade e informação.
Além disso, as
bancadas religiosas tentarão influir, com força, para impedir a
descriminalização do aborto e a união civil entre homossexuais. Será, sem
dúvida alguma, um retrocesso.
Segundo a
Constituição, o Brasil é um país laico. Poderá continuar a ser com esse capítulo virando
letra morta? E o futuro? Vamos ter um presidente necessariamente comprometido
com os dogmas?
Haverá um momento em que o país correrá o risco de ser
transformado na Irlanda dos anos 70, 80,90? O Rio de Janeiro será a Belfast ou
a Derry do final do século 21? Chegaremos,
como paliativo para as discórdias, a ter um presidente neopentecostal e um
primeiro ministro católico?
Ou o
desenvolvimento econômico e o crescimento da taxa de escolaridade se
encarregarão de fazer retornar o brasileiro à postura laica?
*A frase, lá em cima, é do
poeta e jornalista Girlan Miranda
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